Profissionais da Secretaria da Educação que trabalham nas 13 Diretorias de Ensino da capital paulista passaram por formação específica sobre educação inclusiva, por meio da EFAP (Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Professores). O curso “Ensino médio inclusivo: construindo uma escola para todos”, concebido e implementado pelo Instituto Rodrigo Mendes, com apoio do Instituto Unibanco e da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, garantiu aos educadores conhecimentos teóricos e práticos, além de reflexões sobre a cultura do pertencimento e o papel da escola na construção da cidadania.
Como benefício, cada participante obteve a compreensão dos aspectos conceituais dos direitos das pessoas com deficiência e das características da educação inclusiva. Além disso, puderam pensar estratégias que valorizem a diversidade humana na prática profissional. Foram 100 horas de curso, divididas entre aulas no ambiente de videoconferência da DE e o desenvolvimento de um projeto local de intervenção.
Na escola estadual Sergio da Silva Nobreza, após alguns funcionários passarem pelo curso de inclusão, foi desenvolvido o projeto “Crio porque posso”. O nome surgiu após a equipe escolar perceber que alguns pais e mães apresentam dificuldade em acreditar na plena capacidade de seus filhos portadores de deficiência. Por ser uma escola com alta demanda de estudantes nestas condições, foi possível mostrar para os responsáveis dessas crianças que os filhos são capazes de criar.
“Esse curso, na EFAP, foi bem interessante porque pegou vários segmentos da escola, tinha a diretora, a coordenadora e a agente de organização. Ele foi mostrando para a gente a questão da deficiência, da inclusão do aluno, mas não como um menino que tem que ser tratado de forma diferenciada. O que nós temos que fazer é oferecer condições para que ele consiga aprender tanto quanto os outros”, relata a diretora da Sergio da Silva Nobreza, Miriam Ribeiro dos Santos.
Segundo ela, “isso muda aquela visão de que um aluno de inclusão é um coitadinho, que pode fazer o que ele quer, que não pode ser cobrado. Muito pelo contrário, nós temos que oferecer possibilidades pedagógicas e metodológicas para que ele aprenda tanto quanto os outros”, conclui.
“Eu tive oficina de xadrez e os pais jamais imaginaram que os filhos fossem capazes da jogar xadrez. A mesma coisa com a oficina de origamis, que requer maior habilidade manual”, afirma a professora coordenadora da Sergio da Silva Nobreza, Elexandra Maria de Jesus. Ela explica que o projeto foi desenvolvido com a ajuda de alunos oficineiros. Representantes da direção passaram nas salas de aula com fichas de inscrição e explicaram como tudo deveria funcionar. O aluno que entendia de xadrez, por exemplo, ao se inscrever, seria o responsável por toda a produção da oficina, inclusive dar as aulas.
Com apenas 14 anos de idade, Thainá Thomé Pereira, que frequenta as aulas do 9º ano, foi uma desses alunos oficineiros. Sua oficina de maquiagem artística fez muito sucesso, e até ganhou o nome popular de ‘maquiagem dos monstros’. Ela aprendeu a técnica na internet, assistindo vídeos, e sugeriu como sendo algo diferente para os alunos. De imediato, as professoras logo trataram de ajudar com o material, como cola branca, algodão, corante vermelho e outros petrechos.
Sobre a experiência, Thainá diz que foi algo marcante, “pois às vezes você não vê eles interagindo muito, e naquele dia foi muito legal porque as crianças brincaram, deram risadas”. Ela relembra: “aqui na escola nós tínhamos um aluno chamado Isaque, e ele tinha deficiência. Em festas, a gente sempre interagia com ele. Para mim, trabalhar com ele foi muito mais fácil. Mas com outras crianças foi um pouco mais difícil, por eu não entender o jeito delas, as dificuldades. Só que depois tudo foi dando certo”, esclarece a aluna.
Miriam diz que “o interessante é que o projeto repercutiu muito gostoso dentro da escola, da sala de aula. E toda hora o professor está inventando alguma coisa de diferente. Um exemplo bem bonito foi a professora de português que trabalhou um tema da literatura e uma aluna com deficiência intelectual recontou toda a história através do desenho, de como ela entendeu aquele livro. Foi bastante significativo isso.”
A diretora acrescenta que antes do projeto a escola tinha cerca de cinco alunos portadores de deficiência, “e agora estamos com 14 alunos de inclusão. Foi um trabalho curto, mas com uma força tão grande, que hoje a nossa escola está cheia de meninos que têm nos ensinado muito”, finaliza.
Aline Barbosa Lima, Agente de Organização Escolar e pedagoga por formação, acredita que o curso na EFAP facilitou na questão do contato maior com os alunos, sobre, por exemplo, procurar saber o que eles queriam fazer. Funcionária há 7 anos da Sergio da Silva Nobreza, após a prática ela vê mais interação, mais participação dos alunos com deficiência. “Quando a gente propõe um projeto eles se mostram mais interessados”, explica Aline.
“A gente nota também que quando chega um aluno deficiente os outros estudantes são bastante acolhedores. Antes não havia esse costume, pois não tínhamos tantos alunos portadores de deficiência. A partir do momento que eles começaram a se matricular na escola com mais frequência, essa relação mudou bastante, e o acolhimento aconteceu naturalmente. Nossos alunos querem sempre estar perto, querem estabelecer algum tipo de vínculo com os novos colegas”, esclarece a agente.
Aline faz um balanço sobre a importância do curso “Ensino Médio Inclusivo: construindo uma escola para todos”. “Eu acho que foi uma oportunidade para a gente poder ter mais acesso ao tema, de como temos que agir. Pois às vezes a gente trata a inclusão de um jeito equivocado”, afirma. Segundo ela, “até a questão familiar melhorou, hoje os pais estão mais próximos da escola, percebem que a gente trabalha para que os filhos deles sejam atendidos o melhor possível. Quando eles chegam para matricular o filho, a gente apresenta a escola, eles têm contato com os professores e ficam admirados com a nossa estrutura”, finaliza.
O curso “Crio porque posso” mudou muita coisa na vida da comunidade escolar, os pais que antes duvidavam da capacidade de seus filhos começaram a entender que a escola não é um depósito de crianças. Entenderam que na unidade os filhos têm a chance de colocar para fora o que aprendem.
Antes, esses alunos não queriam participar dos projetos da escola, por se sentirem, de certa forma, fora dos padrões. A partir da oficina “Crio porque posso” os alunos com deficiência passaram a ser protagonistas dentro da escola.
A professora Elexandra comemora a volta por cima dessas crianças. Nós temos o Plano de Adequação Individual, o PAI. Os professores passam a mesma atividade da sala, em geral, para alunos com deficiência, mas com as adequações necessárias. E hoje muitos não querem essa facilidade. Essas oficinas proporcionaram isso, a chance de provar que são capazes”, esclarece.