O psicanalista Luís Eduardo Salvucci Rodrigues, de 66 anos, tem uma relação muito próxima com a escola que frequentou. Trata-se do colégio centenário Culto à Ciência, considerado o melhor de Campinas naquela época.
“Estudei no Culto à Ciência (então Colégio Estadual) de 1966 a 1972. Era difícil entrar no colégio. A maioria dos alunos admitidos fazia uma espécie de cursinho juntamente com a quarta série (alguns faziam esse cursinho durante um ano isoladamente, como foi o meu caso), chamado Curso de Admissão, para se preparar para o exame de admissão. A lista dos aprovados era divulgada nos jornais da cidade e era ansiosamente aguardada pelos pais e alunos.”
O apreço e interesse que tem pela escola é tanto que acabou se dedicando a pesquisar sobre sua história. Rodrigues costumava ir ao Arquivo Público de São Paulo para compilar, resgatar e fotografar ofícios e informações. Por conta da pandemia ele precisou parar. “Sim, infelizmente a pesquisa foi interrompida. Não vou ao Arquivo Público do Estado desde março de 2020. Recentemente eles reabriram para consultas sob agendamento, mas não me sinto seguro para retomar neste momento. Pretendo voltar assim que for possível.”
O respeito e afeto que Rodrigues possui pela escola não são exclusivos dele. Ao ser indagado se conhecia outras pessoas que têm o mesmo interesse e carinho pela escola, foi enfático: “Conheço muitas! Praticamente todo ex-aluno. Toda vez que vou ao Arquivo Público do Estado pesquisar os ofícios nas caixas de arquivo eu sinto a companhia de centenas de ex-alunos ansiosos por uma descoberta. Cada informação desconhecida me traz a certeza de que vai ser recebida com muito interesse e carinho pelos ex-alunos.”
Ex-alunos do colégio formaram a Sociedade Amigos do Culto à Ciência (SACC) e, em 1998, promoveram o primeiro encontro no Ginásio Poliesportivo da Unicamp. Mais de dois mil ex-alunos compareceram ao evento, que reuniu turmas de vários anos (da turma de 1928, por exemplo). Alguns vieram do exterior só para participar da festa.
“Nossa relação com a escola não se resume a lembranças e saudades, queremos retribuir o muito que a escola nos deu. Atualmente temos contribuído para que equipes de iniciação científica da escola possam participar de Feiras de Ciências no Brasil e exterior”, garante Rodrigues.
A pesquisa se iniciou por conta de algumas fotografias que o avô de Rodrigues tinha. Além de esportista, ele pertencia à comissão de esportes da cidade de Campinas. Eram registros da construção de um ginásio para a escola no terreno do Culto à Ciência e um dia Rodrigues escreveu sobre esse acervo para um site que conta a história da escola. Desde então começou a pesquisar e se aprofundar mais sobre o assunto. O ginásio era administrado pela Prefeitura de Campinas e tinha um comodato com a escola. Em 1955, o ginásio passou para ser propriedade exclusiva da escola.
“Sempre tive muito apreço pela escola. O início de minhas pesquisas foi para compartilhar um acervo de fotografias que meu avô, Ary Rodrigues, deixou aos meus cuidados. Ele foi o responsável pela construção do ginásio de esportes do Culto à Ciência em 1945 para a realização dos Jogos Abertos do Interior. Na época, Campinas não possuía um ginásio para receber os jogos na cidade e então foi feito um acerto entre o Governo do Estado, a Prefeitura e o Culto à Ciência para a construção do ginásio. O acervo contém as fotos da obra, desde a terraplanagem até sua finalização.”
História
A Escola Estadual Culto à Ciência é a mais antiga do Brasil em funcionamento no mesmo prédio desde sua fundação. Foi inaugurada em 12 de janeiro de 1874, como uma escola particular para meninos por uma associação nomeada Sociedade Culto à Ciência, formada por fazendeiros, industriais e comerciantes (muitos deles maçons e republicanos). Foi concebida para ser uma instituição sem fins lucrativos, aceitando alunos internos que pagassem mensalidades e oferecendo bolsas a alunos pobres.
O Culto à Ciência só funcionou como colégio particular de 1874 a 1892, quando foi transferido para a Prefeitura de Campinas. Desde 1896 passou a funcionar como escola pública estadual, com o nome de “Gymnasio de Campinas”.
Além de ser um patrimônio histórico, tombado pelo Condephaat em 1983, a escola preserva um acervo com mais de 20 mil livros, incluindo obras que datam de 1600 e 1700. O prédio, construído nos moldes da arquitetura clássica francesa, hoje tem o nome de EE Culto à Ciência e é um dos pontos turísticos da cidade.
Personalidades como Alberto Santos-Dumont, pioneiro da aviação, Júlio de Mesquita, jornalista e fundador do jornal “O Estado de S. Paulo”, o apresentador Fausto Silva, a atriz Regina Duarte frequentaram os bancos escolares do Culto à Ciência.
Restauro
Entre as melhorias já realizadas pela Fundação para o Desenvolvimento em Educação (FDE) na escola, houve uma grande obra de restauro, concluída em 2010. Foram investidos mais de R$ 4 milhões, disponibilizados pelo governo paulista para financiar esse tipo especial de reforma, em que há necessidade de preservação do bem tombado, com regras específicas, de modo a não descaracterizar a construção original.
As salas de aula e os laboratórios foram refeitos. Portas e janelas foram artesanalmente recuperadas. Houve o restauro de detalhes simbólicos da arquitetura original: adornos, portas, batentes, ladrilhos. O jardim externo frontal foi totalmente recuperado, com a remoção de árvores condenadas e o cultivo de novas espécies.
Série Escolas Centenárias
Esta reportagem integra uma série de conteúdos sobre as escolas centenárias do Estado de São Paulo e histórias de pessoas vinculadas a essas instituições. O objetivo é apresentar um pouco mais da cultura, curiosidades, intervenções de obras e vivências que fazem parte da história da Educação Paulista.