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terça-feira, 11/02/2003
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Jornal feito pelos índios conta sonhos e histórias da comunidade

Os índios das etnias Guarani, Kaiangang, Tupi-Guarani, Krenac e Terena do Estado de São Paulo produziram jornais contando histórias, poemas, sonhos e reflexões sobre a preservação da cultura e a […]

Os índios das etnias Guarani, Kaiangang, Tupi-Guarani, Krenac e Terena do Estado de São Paulo produziram jornais contando histórias, poemas, sonhos e reflexões sobre a preservação da cultura e a percepção da sociedade.

O material elaborado pelos índios faz parte da estratégia pedagógica aplicada no curso de Formação de Professores Indígenas para Educação Infantil e Ciclo I (1ª a 4ª série do Ensino Fundamental), oferecido pela Secretaria Estadual da Educação, que foi concluído em dezembro do ano passado. O jornal foi produzido nos Pólos localizados nas cidades de Guarujá, Bauru e Tucuruvi.

As aulas foram ministradas pela Fundação da Faculdade de Educação da USP, em parceria com a Secretaria Estadual da Educação, e vai formar, até o final de setembro deste ano, mais 41 professores índígenas.

Os jornais trazem informações sobre campeonatos indígenas, direitos, receitas, encontros com educadores, cruzadas, crônicas e até coluna social.

No jornal produzido pelos índios Tupi-Guaranis, uma piada curiosa: “Os padres catequizadores encontraram o cacique Tibiriçá e, fazendo amizade, perguntaram se ele queria ser cristão. O índio aceitou. O padre levou-o ao rio e mergulhou a cabeça do índio três vezes, dizendo que a partir daquele momento, Tibiriçá não seria mais Tibiriçá e, sim, João. No dia seguinte, uma sexta-feira, os padres ouviram um barulho à beira do rio e viram Tibiriçá ou João batizando uma paca. Dizendo as mesmas palavras do padre, repetiu: a partir de agora você não é mais paca e sim peixe, afundou três vezes a cabeça da paca na água. Em seguida, levou o animal para casa para comê-lo como peixe”.

Outras curiosidades compõem o jornal como a receita de farinha de peixe, o qual, depois de assado, deve ser amassado num pilão até virar farinha e, depois, coado. Há, também, a receita cultural, que ensina como manter em “forma” as panelas de barro. O segredo: depois de pronta, coloque a panela sobre uma pedra, despeje cortiça seca e coloque fogo.

Dentre os deveres de um professor indígena, o aluno-professor cita o direito à terra; à riqueza biológica de sua área e do Brasil e aos materiais existentes na natureza, que permitem manifestações artístico-culturais de seu povo. Os direitos inseridos na Constituição Brasileira também são lembrados: “são reconhecidos aos indígenas a sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.

Os textos também alertam para a questão ambiental. Além disso, reforçam costumes indígenas: ” a festa dos pássaros são pequenos dramas musicados que acontecem em junho, no inverno. Representam uma caçada, a morte, a ressurreição de um pássaro”.

Para a Coordenadora do Núcleo de Educação Indígena da Secretaria, profª Deusdith Bueno Velloso, ” o jornal foi construído durante as aulas de didática e reflete o currículo da escola, numa linguagem própria, onde eles usam as cores, os desafios e utilizam todos os códigos”, afirma, Deusdith.

Um dos pontos mais fortes deste canal de comunicação é a consciência da preservação da cultura indígena, como foi observado pela índia, Jaciara Nhõboéa, da aldeia de Bananal, em Peruíbe. Ela escreveu o seguinte texto:

” Em meio aos olhares desconfiados das matas, surgem pegadas em folhas secas, um caminho deixado pela natureza e seguindo este caminho, surge um indígena Tupi, deixando para tras os olhares ambiciosos dos indígenas que tentam segui-lo mas, não conseguem, pois diante da agilidade e habilidade fica apenas a fumaça de seus rastos, depois de embrenhar-se na mata, some da mesma forma que aparece num piscar de olhos.

Assim é o indígena filho de “Nhanderú” – representante vivo, com garra para defender a natureza e tudo o que “Nhanderú” criou.

Esse é o espírito da selva, pronto para lutar pela preservação e respeito à natureza.

Como guardiãs, nós indígenas de todo o Brasil, nos preocupamos e defendemos as matas, a fauna, flora e mananciais com unhas e dentes e, se preciso, com a própria vida” !