Biloca, bolita, bugalho, cabeçulinha, fubeca, pinica. Leitosa, aopaco, bazuca, boticão. Se você nasceu no século passado, com certeza já sabe o que essas palavras têm em comum. Todas são formas variadas para se referir a uma das brincadeiras mais legais entre as crianças: a bolinha de gude. Mas, para uma professa da escola Antonio de Oliveira Bueno Filho, de Araraquara, interior de São Paulo, a berlinde passou a ter outra finalidade, além da diversão. As bolinhas foram para dentro da escola e se tornaram ponto de partida para o “Projeto Bolinhas de Gude: Descobrindo Outras Formas de Ensinar, Aprendendo Outros Jeitos de Aprender”, que ficou entre os 10 finalistas do Prêmio Educador Nota 10.
A professora Cristiane Pereira de Souza Francisco, que leciona Educação Física para alunos do Fundamental – Anos Iniciais, deu origem ao projeto no segundo semestre de 2016. De imediato foi feita uma atividade de Conhecimentos Prévios dos alunos, uma forma de entrevista onde ela perguntou que já tinha brincado de bolinha de gude. De 29 crianças, somente 7 responderam que já haviam brincado com o objeto.
Outra pergunta é se aquela era uma brincadeira de meninas ou de meninos. Outra surpresa, quando 4 disseram que era de meninos, inclusive uma menina. O restante sabia que as bolinhas poderiam ser usadas tanto por meninas, quanto por meninos. A maioria da sala até conhecia o brinquedo, pois irmãos mais velhos possuíam alguns exemplares. No entanto, nunca haviam brincado, tendo em vista que os donos não deixavam.
Foi aí que Cristiane levou a tarefa para um segundo momento. Com os alunos na quadra poliesportiva da escola, cada um recebeu exemplares de bolinhas de gude. A professora orientou sobre as regras de segurança, como não atacar o objeto no colega, não colocar na boca e não jogar com muita força no chão. Feito isso, disse a eles para brincarem livremente.
Nenhum dos alunos fez o esperado… eles jogaram futebol, fizeram malabares, se juntavam, jogavam todas para o ar e tentavam pegar a maior quantidade possível. Segundo Cristiane de Souza, “eles exploraram bem o material. Fizeram de tudo, menos o jogo convencional que eu esperava. Essa aula foi inteira assim”, finaliza. A professora anotou as experiências da classe, como parte do projeto.
A aula seguinte não foi totalmente livre. Houve uma interferência gradativa da professora para que eles fossem adequando maneiras diferentes de interagir, como soluções em dupla ou grupo. Algumas regras foram criadas, como não jogar a bolinha e correr atrás. No fim da aula, Cristiane pediu que eles pesquisassem em casa, ou na internet, como o objeto deveria ser utilizado para brincar.
As crianças levaram para dentro dos portões da escola as formas que aprenderam em casa, com a finalidade de transmitir o conhecimento aos colegas. Assim, eles foram construindo a aula e depois partiram para a vivência prática. “Juntaram diversas formas de brincar dentro do método convencional, e após dividirem esse conhecimento começaram a socializar, e até mesmo a mesclar o aprendizado adquirido em casa”, esclarece a professora Cristiane.
O “Projeto Bolinhas de Gude: Descobrindo Outras Formas de Ensinar, Aprendendo Outros Jeitos de Aprender” já era um sucesso até então. Com ele, Cristiane conseguiu ensinar uma brincadeira nova, levou a aula até a casa dos alunos, que puderam interagir com seus familiares, e fez com que os próprios estudantes criassem todo o processo de aprendizagem – mote do projeto. Cristiane fazia suas anotações levando em consideração todas as devolutivas das crianças. Com base nisso ela conseguia moldar as aulas seguintes.
Além disso, Cristiane explicou a diferença entre uma brincadeira e um jogo, pois um tem regras maleáveis, enquanto que as regras do outro dificilmente são alteradas. Após explicar a importância das regras conseguiu chegar no tema esporte, e fez com que os pequenos pudessem compreender como funciona uma competição esportiva. Assim, todos souberam diferenciar o momento em que estavam brincando do momento em que estavam jogando.
Na sala de vídeo, Cristiane ensinou o regionalismo, após passar diversos vídeos com atividades variadas do jogo de bolinhas de gude pelo Brasil. Com as diferentes modalidades, como Três Covinhas, Jogo da Mata, Círculo, Estrela, Triângulo e Meia Lua, entre outras, foi a vez de ensinar a Geometria. Com todas essas possibilidades, o Projeto se tornava cada vez mais completo. E, para Cristiane de Souza, “o principal objetivo sempre foi valorizar o protagonismo das crianças no processo de aprendizagem”, conclui.
Quando perguntada sobre a importância em ouvir os alunos, Cristiane de Souza é enfática. Ela diz que “não é só ouvir, pois muitas vezes a gente ouve e não leva em consideração por não estarmos dispostos a escutar cada um deles. Temos que deixar eles falarem, sentar com eles… eles avaliam o trabalho e dão uma devolutiva melhor quando a gente escuta eles. E essa é uma forma de avaliá-los também”, finaliza a professora.
Prêmio Educador Nota 10
Sobre o Prêmio Educador Nota 10, Cristiane já sente uma vitoriosa. Ela relata que “não iria inscrever o Projeto no Prêmio, pois achei que era algo tão simples. Achava que para participar tinha que ser algo mirabolante, mais trabalhoso”, afirma.
Organizado pela Fundação Victor Civita há 20 edições, o concurso reconhece as iniciativas de profissionais da Educação Infantil e Ensino Fundamental (incluindo Educação de Jovens e Adultos – EJA).
Atualizado em 31 de outubro.